sábado, 22 de maio de 2021

TOPIC MAN - TRIÂNGULO PRETO

O vento uiva incessantemente e as areias ásperas que voam como um bando de zangões prateados rasgam impiedosamente qualquer outro tipo de superfície menos ríspida que o silício. A luz difusa e onipresente não tem origem e nenhum sol, astro ou estrela aparente. A luz simplesmente existe, ilumina sem foco e cozinha tudo que toca lenta e pacientemente como uma caldeira em fogo baixo. Não há criatura viva em cenário de tamanha aridez e hostilidade. 

 

Bem-vindos ao deserto de Mwo’nu.

 

Em uma colina distante formada por dunas em constante degradação um curioso objeto preto pode ser visto brilhando em contraste com os tons ocres do Mwo’nu abaixo. Um zumbido dissonante em frequência completamente distinta dos sons abrutalhados dos ventos que corroem praticamente qualquer comprimento de onda sonora pode ser ouvido da direção da maldita colina. 

O misterioso objeto que se sustenta flutuando impassível à própria gravidade e às intempéries múltiplas de tal cenário, é envolto em uma pequena aura composta de algo que poderia ser descrito somente como uma anti-luz – descrita por um tipo inteiramente desconhecido de espectro fotométrico que parece anular não só a luz inclemente do deserto mas também toda e qualquer outra reflexão ao seu redor. Sobre a colina que parece temer a presença que se encontra a alguns centímetros de seu cume, nota-se a forma do objeto que desafia não só as areias mas toda a realidade a seu redor: um triângulo. E, por falta de palavra adequada em qualquer língua conhecida por humanos, feras ou deidades para descrever sua “anti-luz”, resta a nós chama-lo de “triângulo preto”. 


Enquanto a anti-luz do “triângulo preto’ parece sugar todo o restante de vida que ainda há no Mwo’nu com sua sinfonia estática e penetrante, pequenas falhas em todo o panorama ao redor se manifestam. Como se, até onde a vista alcança, por frações de segundo, tudo falhasse e desaparecesse. Inicia-se um balé de pequenas piscadas de olhos do tecido da realidade causado por algum tipo de interferência vinda diretamente do triângulo. 

Em pouco tempo o pequeno zumbido oriundo da colina subjuga o rosnar selvagem e até então indomável do vento e reina soberano sobre toda frequência sonora emitida no lugar. A anti-luz do triângulo se intensifica e as falhas na realidade tornam-se mais longas e menos espaçadas, como interrupções no próprio fluxo existencial do deserto. A sensação de colapso de realidade é iminente até que todo som se cala e todo o caos de vento se aquieta no Mwo’nu. 

De dentro do triângulo uma silhueta em forma humana e coloração contrastante com a anti-luz emerge lentamente caminhando de forma despreocupada em movimentos casuais: Aos poucos um homem alto, de cabelos longos e com vestes rústicas caminha para fora do triângulo preto e toca as areias do deserto com seus pés descalços e cascudos. O homem, vestido somente com uma capa esfarrapada e uma tanga com um volume desproporcional carrega nas costas uma grande espada de batalha embainhada. Em suas mãos e pés o homem porta braceletes com velhas correntes partidas que aparentam provenientes de algum cárcere há muito sofrido. 



Eis o Topic Man.


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